Monday 20 September 2010

As virtudes do secularismo


A visita oficial do Papa Bento XVI ao Reino Unido correu, por várias razões das quais elenco as mais relevantes, muito melhor do que se esperava:

1. O Papa não fugiu dos assuntos polémicos nem fingiu que não há problemas sérios na Igreja, nomeadamente os crimes de pedofilia praticados por padres e a reacção da hierarquia, que encheu as páginas dos jornais durante semanas a fio e que prometia envenenar todo o programa.

2. Mesmo sendo complicado participar nas cerimónias públicas, já que os fiéis só tinham acesso aos recintos da vigília de Hyde Park e da missa em Birmingham se estivessem enquadrados pelas respectivas paróquias, as expectativas das autoridades em termos de números de presentes foram largamente ultrapassadas em todas as aparições do Papa. A tal ponto que o Presidente da Associação dos Agnósticos foi para a BBC dizer coisas ridículas como “são quase todos turistas” e outras patetices do género.

3. A “grande” manifestação contra a presença do Papa, que congregava a coligação negativa mais variada – activistas dos direitos das mulheres, dos homossexuais, pessoas contra a moral sexual da igreja, aqueles que não concordam com a política de planeamento familiar propostas pelo Vaticano, a esquerda mais aguerrida, os agnósticos militantes e os anglicanos mais fervorosos, para nomear apenas alguns - reuniu algumas centenas de pessoas, o que é manifestamente pouco quando consideramos a variedade de temas e razões de queixa representadas.

4. A reunião entre o Papa e o Arcebispo de Cantuária, Primaz da Igreja Anglicana, correu particularmente bem, considerando as queixas da hierarquia anglicana contra o mecanismo criado pelo Vaticano que facilita o ingresso na Igreja Católica dos pastores da Igreja de Inglaterra que estejam contra a ordenação de mulheres e de homossexuais para o bispado.

Duas razões parecem-me relevantes para explicar este sucesso. Por um lado, a qualidade e a coragem intelectual do Papa Bento VI que não negou as evidências, assumiu as dificuldades e enfrentou os problemas de frente. Por outro lado, o Reino Unido, sem prejuízo para o facto de ser a única democracia ocidental onde existe uma igreja oficial e o Chefe de Estado é o Chefe da Igreja, é uma sociedade completamente secularizada onde cada um é livre de rezar – em público ou em privado – ao Deus que entenda e ninguém tem nada a ver com isso.

Há quem veja nisso um problema. Eu acho que é uma virtude.

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